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25.6.10

105. um dia no centro de porto alegre 2

fiquei tão empolgada em narrar o trajeto do C3 que esqueci o objetivo central deste post. fui até um café do centro esperar pela minha prima. para não usufruir do espaço sem nada consumir, optei por pedir um expresso. logo após pedir, solicitei um banheiro onde eu pudesse lavar as minhas mãos.
- ali atrás tem um. pode usar.
a primeira coisa que vi foi uma barata sendo comida por formigas. horrível a cena, mas já era de se esperar que estabelecimentos servindo comida no centro da cidade fossem acometidos por esses males. porém eles bem que podiam ter varrido a barata dali, né?!
imediatamente lembrei do expresso que havia pedido. em outros tempos, quando eu era mais inocente do que sou agora, eu pensaria que a máquina de café garantiria a intergridade sanitária do mesmo. mas após lembrar do café, lembrei da priscila:
- tu sabia que é comum encontrarem pedaços de baratas em máquinas de café? uma vez uma guria vomitou por causa disso.
não, eu não sabia, e preferia nunca ter ficado sabendo disso. a história inteira conta que insetos de tipos e tamanhos variados costumam se aglomerar em máquinas de bebidas - não apenas as de café, mas também é comum nas de refrigerante.
resolvi sentar numa mesa de frente pra rua e esquecer dessas histórias todas. esperei estoicamente pelo tal café, que foi trazido em seguida por uma atendente de mãos muito, mas muito molhadas (o que não quer dizer limpas). ao inclinar-se ao meu lado para depositar a xícara sobre a mesa, ela olhou muito de perto e com os olhos muito fixos em mim e disparou:
- onde que tu mora?
fiz que não ouvi, agradeci. ela se aproximou de novo, inclinada, e, mais uma vez:
- onde que tu mora?
como assim onde eu moro? senti-me ameaçada.
- moro em porto alegre.
- ah tá... é que tu parece com uma guria lá de alvorada.
- é que eu já morei em alvorada.
- então é isso.
era só isso. a mulher me conhecia de alvorada.

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sendo vitimada pelo expresso, acompanhava o movimento na rua.
uma mulher que tinha por volta de quarenta anos e que provavelmente trabalhava em outra espelunca insalubre das proximidades, vinda provavelmente, em condições péssimas de transporte, de alguma cidade da periferia da região metropolitana, parou diante do tal café onde eu estava e, fumando um cigarro, buscou o contato com a atendente de mãos molhadas que havia me atendido.
- e aí... - de vez em quando ela assoprava fumaça pra cima, meio rindo, meio tremendo - o meu amigo nunca mais apareceu aqui.
- ah não?
- não... o que será que houve? - já mencionei que havia uma certa e quase imperceptível tensão nessa mulher, que se manifestava com um tremelico no canto da boca, enquanto ela fingia sorrir?
- ah... tem gente que não vem muito seguido pro centro...
- pois é...
ela ainda fumava. dava pra ver que ela estava totalmente interessada naquele assunto, mas a outra não. dava pra ver que era um assunto realmente importante pra ela. de repente:
- ele até me deixou o telefone... mas eu não quero ligar. acho chato gente que fica em cima, insistindo...
o sorriso nervoso persistia. o sorriso falava mais do que ela. era uma mulher com uns quarenta anos, teria ainda pouco tempo de se arrumar com alguém. e esse cara parecia estar dando bola pra ela, parecia mesmo, ela alimentou esperanças. ela acreditou que era isso e isso talvez tenha feito a vida dela ser melhor. mas o cara simplesmente nunca mais apareceu.
- se ele não aparecer mais, vou ligar.
ela sabia que ele não queria nada com ela. mas ela não podia se confrontar com essa verdade. ela sabia que não devia ligar, mas precisava fazer alguma coisa por aquilo. o centro de porto alegre pode ser muito profundo.

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